As creches e a aprendizagem na primeira infância
Há tempos, foi realizado um importante seminário internacional no Rio de Janeiro sobre desenvolvimento infantil que procurou enfatizar a importância da atenção à primeira infância. Especialistas de diferentes partes do mundo mostraram os avanços da área da neurociência e o impacto de programas de creche, pré-escola e atendimento em saúde a crianças e gestantes para a redução das desigualdades e o sucesso escolar. As pesquisas sobre o tema mostram, com bastante consistência que o acesso a programas de educação infantil melhoram o desempenho do aluno em avaliações de aprendizagem, reduzem a repetência escolar, aumentam a probabilidade de conclusão do Ensino Médio e reduzem comportamentos nocivos como criminalidade, delinqüência juvenil e uso de drogas. Ou seja, ao ter acesso a uma creche e pré-escola de qualidade, a criança terá melhores chances de uma vida mais digna no futuro. Isso se deve à combinação de um maior estímulo cerebral, na fase em que se formam a maior parte das conexões neurais e de uma alimentação mais apropriadas. Com uma creche em que os profissionais lêem histórias para as crianças pequenas, criam um ambiente em que o brincar possibilita interações ricas com seus pares, em que há uma imersão inicial da criança no mundo letrado, na forma de livros adequados para esta fase, o desenvolvimento ocorrerá de forma saudável e o vocabulário delas será ampliado. Ora, é especificamente no vocabulário que começam as diferenças de chances de sucesso escolar entre ricos e pobres. Uma criança de família mais rica e instruída tem um vocabulário bem mais extenso que a de origem social mais humilde. A partir daí começam as diferenças para a capacidade de se comunicar oralmente e por escrito e entender o que se lê. A creche e uma atenção às famílias que favoreça a leitura e a continuidade dos estudos da mãe ajudam na redução desta desigualdade. Em recente entrevista à revista Veja, James Heckman, ganhador de prêmio Nobel ressalta a importância de se investir em Educação nos primeiros anos de vida ao afirmar que “uma criança de 8 anos que recebeu estímulos cognitivos aos 3 conta com um vocabulário de cerca de 12 000 palavras – o triplo do de um aluno sem a mesma base precoce. E a tendência é que essa diferença se agrave”. E coloca a pergunta que torna clara a raiz das desigualdades no desempenho escolar: “Como esperar que alguém que domine tão poucas palavras consiga aprender as estruturas mais complexas de uma língua, necessárias para o aprendizado de qualquer disciplina?”. É com base nestas reflexões que iniciamos o desenho e a implantação de um novo modelo de atendimento à primeira infância que inclui a articulação de diferentes políticas públicas, como a Educação, a Saúde e a Assistência Social e uma agressiva ampliação da rede de creches na cidade. Associa-se a isto uma forte preocupação com a qualidade da atenção oferecida, em que a capacitação de agentes auxiliares de creche será uma prioridade, junto com a maior presença de professores articuladores em cada uma. Um trabalho com a família, com visitações domiciliares também se incorpora ao modelo. Mas o mais importante é prosseguir na transformação em curso do papel das creches. Elas não são mais meros lugares de guarda e proteção de crianças. Creche é lugar de aprender.
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